O ministro do Supremo Tribunal Federal Marco Aurélio Mello sempre cultivou a imagem de senhor cordial e bonachão, com sua fala que é ao mesmo tempo professoral e afável. Diferente de Teori Zavascki, que sempre teve aquele ar severo que Reinaldo Azevedo diz ser próprio dos burocratas búlgaros do período soviético. Marco Aurélio até sorria. A escrita no passado se justifica, uma vez que sua vida provavelmente não será mais a mesma daqui para frente.
Na última segunda-feira, 4, o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal), Marco Aurélio de Melo, participou do programa Roda Viva da TV Cultura (assista ao programa na íntegra no final da matéria). O ministro começou o programa sorrindo e terminou, provavelmente, chorando. Logo no começo o jornalista José Nêumanne Pinto lhe desferiu um "cruzado no queixo" com questionamentos sobre a conduta dele e do STF diante da atual situação nacional e de suas decisões e opiniões repletas de controvérsias e protecionismo. O combalido magistrado chegou a se escorar e esboçar uma reação, mas quando a roda parou novamente em Nêumanne, o ministro foi parar nas cordas. Dali em diante ele já não tinha mais o controle da situação. José Nêumanne Pinto defenestrou o personagem interpretado por Marco Aurélio ao longo desses anos, e expôs todas as contradições do sujeito que, conforme comentários na internet e na mídia em geral, colocou a toga a serviço de Dilma Rousseff, PT, após conseguir que a presidente nomeasse sua filha como desembargadora no TRF do Rio de Janeiro. Diferente da Ismália de Alphonsus de Guimaraens, o corpo de Marco Aurélio desceu ao chão, e sua alma foi ao purgatório.

Letícia Mello, filha do ministro do STF, foi nomeada nesta quarta-feira pela presidente Dilma Rousseff desembargadora do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (Rio de Janeiro e Espírito Santo); ela disputou a vaga com outros dois advogados mais experientes; aos 37 anos, é considerada nova para assumir o cargo
O ministro que ficou perdido em meio ao bombardeio só ficou perdido daquela forma porque é um homem de meias verdades. Um homem que diz que “estamos evoluindo” apesar do caos planejado pelo Partido dos Trabalhadores. Um homem que critica Sérgio Moro e depois o elogia sob pressão, um homem que diz que está sendo técnico apesar de adiantar posições sobre o pedido de impeachment de Michel Temer. Um homem que diz que Temer não está acima da lei e que Dilma não pode ser julgada de maneira precipitada. Marco Aurélio é um embusteiro que não sobreviveu ao crivo da verdade.
Nêumanne deu uma aula de jornalismo. Agiu em nome do interesse público, que não confia na mais alta corte da justiça. Fez as perguntas difíceis que seriam evitadas por jornalistas entreguistas como Cristiana Lobo, Kennedy Alencar ou Chico Pinheiro. Fez o que se espera de um jornalista, que é perguntar o que as autoridades não gostam de responder. Não foi igual aquela constrangedora e imoral entrevista concedida por Lula ao Kennedy Alencar em que o irmão do Beckembauer Rivelino só erguia a bola para Lula cortar. Deixar políticos extremamente confortáveis e fazer perguntas previamente combinadas para dar picadeiro à ilusionistas e demagogos não é jornalismo, é publicidade.
A sequência de bordoadas demonstrou como o STF é semelhante ao diagnóstico de Lula: uma corte acovardada. Essa corte acovardada é ocupada majoritariamente por tipos como Marco Aurélio, que usam a toga para fazer política. São os garantistas da barbárie e do golpe, cabe a eles assegurar que nada dê errado para o governo. Homiziados no prédio do STF, esses indivíduos dotados de poderes imperiais se julgam acima do bem e do mal, acreditam até que é obrigação dos indivíduos confiarem em uma corte que se colocou de joelhos para o plano criminoso de poder. Marco Aurélio teve de ouvir de José Nêumanne Pinto que ele não confiava no STF, além de passar pelo vexame de ter as entranhas da corte expostas em rede nacional. Foi um dia terrível para Marco Aurélio, e um dia gratificante para os brasileiros. A justificativa atrapalhada do ministro que se acha acima de todos negando que tenha criticado o juiz Sérgio Moro para logo depois tomar uma invertida de Nêumanne (que mostrou que ele mentiu) foi um dos pontos altos do programa, juntamente com os minutos iniciais e a pergunta de, que perguntou na lata se impeachment é golpe. Sabemos que ainda há jornalistas no Brasil, e ainda é possível confiar em certos formadores de opinião. A expressão facial de Marco Aurélio era muito semelhante ao misto de pânico e impotência sentidos pela Dra. Ryan Stone, a personagem de Sandra Bullock no filme Gravidade, que se desprende de sua base espacial e fica vagando no espaço. Marco Aurélio foi digno de pena ali. Considerando o que hoje conhecemos dele, é bem possível que aquelas expressões chorosas fossem de alguém que no íntimo queria mesmo era gritar em plenos pulmões que “Não vai ter golpe”.

* Eric Balbinus é editor do site O Reacionário e um dos coordenadores do Movimento Brasil Livre