Denúncias publicadas na imprensa apontam que agências americanas de segurança monitoraram telefonemas e e-mails de brasileiros e demais latino-americanos. O governo brasileiro tem cobrado esclarecimentos dos Estados Unidos.
Matéria do jornal O Globo de 6 de julho denunciou que brasileiros, pessoas em trânsito pelo Brasil e também empresas podem ter sido espionados pela Agência de Segurança Nacional dos Estados Unidos (National Security Agency - NSA, na sigla em inglês), que virou alvo de polêmicas após denúncias do ex-técnico da inteligência americana Edward Snowden. A NSA teria utilizado um programa chamado Fairview, em parceria com uma empresa de telefonia americana, que fornece dados de redes de comunicação ao governo do país. Com relações comerciais com empresas de diversos países, a empresa oferece também informações sobre usuários de redes de comunicação de outras nações, ampliando o alcance da espionagem da inteligência do governo dos EUA.
Ainda segundo o jornal, uma das estações de espionagem utilizadas por agentes da NSA, em parceria com a Agência Central de Inteligência (CIA) funcionou em Brasília, pelo menos até 2002. Outros documentos apontam que escritórios da Embaixada do Brasil em Washington e da missão brasileira nas Nações Unidas, em Nova York, teriam sido alvos da agência.
Logo após a denúncia, a diplomacia brasileira cobrou explicações do governo americano. O ministro das Relações Exteriores, Antonio Patriota, afirmou que o País reagiu com “preocupação” ao caso.
O embaixador dos Estados Unidos, Thomas Shannon negou que o governo americano colete dados em território brasileiro e afirmou também que não houve a cooperação de empresas brasileiras com o serviço secreto americano.
Por conta do caso, o governo brasileiro determinou que a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) verifique se empresas de telecomunicações sediadas no País violaram o sigilo de dados e de comunicação telefônica. A Polícia Federal também instaurou inquérito para apurar as informações sobre o caso.
Após as revelações, a ministra responsável pela articulação política do governo, Ideli Salvatti (Relações Institucionais), afirmou que vai pedir urgência na aprovação do marco civil da internet. O projeto tramita no Congresso Nacional desde 2011 e hoje está em apreciação pela Câmara dos Deputados.
Íntegra do discurso da Presidente da República, Dilma Rousseff, durante reunião de Cúpula dos Estados Parte e Estados Associados do Mercosul e convidados especiais
Montevidéu-Uruguai, 12 de julho de 2013
Agradeço ao querido amigo Pepe Mujica a calorosa acolhida em Montevidéu, e felicito o seu governo pela condução do Mercosul nesse semestre. A liderança do presidente Mujica tem sido fundamental para a manutenção e a vitalidade do nosso processo de integração.
Uma especial saudação ao presidente Nicolás Maduro, que participa pela primeira vez como chefe de Estado de uma reunião do Mercosul, o que muito nos orgulha. Desejo muita sorte à frente da Presidência Pro-Tempore do Bloco no próximo semestre. Apresento a minha inteira solidariedade e os melhores esforços para que nós possamos dar sustentação para essa Presidência Pro-Tempore. Você continuará, Nicolas, a contar com o nosso apoio nessa empreitada.
Queridos amigos, queridas amigas aqui presentes,
O Mercosul é a mais bem-sucedida e a mais abrangente iniciativa de integração já empreendida na nossa região. Desde a assinatura do Tratado de Assunção, em 1991, transformamos a lógica das relações na Bacia do Prata e no conjunto da América do Sul.
Transformar a lógica das relações é algo muito difícil, no século passado e neste século. Hoje, nosso bloco (falha no áudio) da integração comercial. É um projeto de desenvolvimento compartilhado entre nós. Um projeto de valorização, de inclusão social e que, pela primeira vez, torna a nossa população sujeito histórico efetivo do processo de transformação nas nossas regiões.
As nossas iniciativas são as mais variáveis. Vão da infraestrutura às telecomunicações; da Ciência e Tecnologia à Educação; da ampliação de suporte à pequena agricultura ao meio ambiente, à preservação do meio ambiente; das políticas de higiene, daquelas políticas que, de fato, reconhecem que discriminação contra as mulheres, contra os negros e os índios fazem parte de um real processo de democratização; do combate ao ilícitos internacionais ao desenvolvimento participativo de nossas fronteiras. Cada vez mais somos um Mercosul, um Mercosul diverso, mas um Mercosul que busca sua natureza, sua alma e, sobretudo, um Mercosul que tece as relações econômicas entre nós, as relações sociais e as relações políticas. E nos orgulhamos muito, depois de uma longa trajetória, de termos nos tornado um Mercosul integrado por países democráticos, que tornam, e eu repito, pela primeira vez na história, suas populações protagonistas desse processo.
Nós precisamos resguardar esse patrimônio comum construído por muitos antes de nós – a presidenta Cristina citou alguns: o presidente Chávez, o presidente Lula e o presidente Kirchner –, construído também por outros antes deles, mas, sobretudo, nas últimas décadas que projetou o Mercosul diante do mundo.
Nossos críticos esquecem que desde o início dos anos 90 nosso intercâmbio comercial multiplicou-se mais de 12 vezes, passando de US$ 4,5 bilhões para US$ 58 bilhões, em 2012. Nesse mesmo período, o nosso comércio com o mundo cresceu apenas oito vezes. O mercado comum que compartilhamos, destino privilegiado das exportações de nossos países nos proporcionou melhores condições para enfrentar as fortes crises da economia internacional, como a de 2008, que se arrasta e ainda persiste.
A fluidez dos vínculos comerciais e de investimentos têm sido um incentivo fundamental ao aprofundamento da integração do Mercosul em novas cadeias produtivas. Com esse ânimo, saúdo a realização, ontem, do II Fórum Empresarial do Mercosul, que deve se consolidar como um espaço permanente de discussão para os nossos empresários e agentes econômicos.
Estamos aprimorando o funcionamento da União Aduaneira, e sabemos que é preciso aperfeiçoar a inserção externa de nossas economias em conjunto do Mercosul nas cadeias globais de valor. Essa estratégia comum de ampliação de nossa presença, de uma presença competitiva no mundo, deve estar em sintonia com o modelo de desenvolvimento que fortaleça nossas indústrias, que estimule a diversificação produtiva, a diversificação do comércio e que assegure a mais ampla inclusão social e redistribuição de renda, aprofundando a nossa democracia.
Nesse contexto, sabemos que um dos maiores patrimônios que podemos legar para as futuras gerações é o incentivo, a maior ampliação possível dos processos de educação em nossos países, e a busca constante e perene por mais capacidade de agregação de valor e de valorização do trabalho em nossos países através da ciência, da tecnologia e da inovação.
O Mercosul possui uma estrutura econômica diversificada, variada, e deve ter uma política comercial externa que reflita todas as nossas potencialidades. Nesse espírito, creio que uma nova agenda de inserção externa para o Mercosul poderia contemplar cronogramas mais acelerados para a negociação comercial entre o Mercosul e outros países da América do Sul e também com a União Europeia; negociações no âmbito da América do Sul em serviços e em investimentos entre as nossas economias; promoção de novos acordos comerciais com os nossos irmãos, os nossos irmãos africanos, transformando a cooperação entre o Mercosul e a África em uma relação estratégica para todos nós. E também termos uma política de estímulo ao comércio e investimento para outras regiões do mundo.
Senhores presidentes, senhoras presidentas, senhores vice-presidentes, senhores ministros, senhores representantes de delegações dos países irmãos, senhora presidenta da Argentina, Cristina Kirchner, queridos presidentes dos países aqui representados, e aqui eu queria cumprimentar... quero cumprimentar o presidente da Guiana, Donald Ramotar, o presidente de Honduras, Porfírio Lobo, o vice-presidente de Cuba, Ricardo Cabrisas, o vice-presidente do Equador, Jorge Glas.
E queria dirigir um cumprimento muito especial, solidário, ao presidente Evo Morales. Esse cumprimento ao presidente Evo Morales faz parte da convicção de que essa região não pode deixar de manifestar o mais integral repúdio ao tratamento dispensado a um de nossos presidentes por países europeus. Cada um de nós tem que defender essa posição de repúdio, não só por causa do presidente Evo Morales, mas porque uma parte de cada um de nós, presidentes de países latino-americanos, foi ofendida e foi de fato atingida por esse ato. Não há a possibilidade dessa solidariedade não se refletir em atos concretos e efetivos, seja junto aos governos, como junto aos embaixadores desses países. Por isso considero que para nós é muito importante que tenhamos uma estratégia de integração, que contemple tanto a nossa presença competitiva no mundo, que seja em sintonia com o desenvolvimento de nossa população, mas também que respalde, referende e lute por um respeito integral, ao fato de que somos países soberanos nos quais os direitos humanos, em especial os direitos individuais integram as nossas constituições e as nossas legislações.
Voltando à questão de uma agenda competitiva internacional. Eu queria destacar que o Brasil vai se prestar sempre a uma cooperação cada vez mais ampla no âmbito do Mercosul e de todas as suas instâncias. Por isso... Senhoras e senhores,
Eu quero saudar aqui um fato, o fato do Mercosul passar por um importante momento de ampliação de sua área de abrangência. O ingresso efetivo da Venezuela no Bloco, além de aportar ganhos econômicos, presidente Maduro, ganhos de escala, reforça a dimensão política, a dimensão estratégica do Bloco. A Venezuela amplia a capacidade do Mercosul de irradiação para o norte do continente. E eu tenho certeza, presidente Maduro, em direção ao Caribe e à América Central.
Queria também dizer que nós, nesse último semestre, demos início às negociações relativas à adesão da Bolívia, o que torna também mais consistente o Mercosul, uma vez que passa a integrar um país da região andina. Também prosseguimos com o diálogo com o Equador.
Com a Guiana e o Suriname concluímos as negociações para o ingresso nesta Cúpula de ambos, como Estados Associados. E queria dizer que, como Estados Associados, a Guiana e o Suriname são muito bem-vindos.
Todos os países da América do Sul passam a participar, de uma forma ou de outra, em níveis distintos, com categorias diferenciadas, do Mercosul. E isso, para nós, é uma grande conquista. Temos, porém, uma tarefa importante a realizar, e aí eu me refiro ao regresso do Paraguai, sócio fundador do Mercosul. A posse do presidente Horacio Cartes, daqui a pouco mais de um mês é motivo de esperança, de muita expectativa para a região.
Gostaria de dizer que o Paraguai e o povo paraguaio são partes essenciais do destino do Mercosul. Queremos tê-los de volta. Acredito que essa é uma tarefa que, como expressou o nosso presidente pro-tempore no próximo semestre, o Nicolás Maduro, será perseguida por todos nós, com muita determinação no sentido de assegurar que o Paraguai volte para o Mercosul, e aqui eu queria registrar e constatar um fato que mostra a maturidade política e econômica do Mercosul. Nós jamais tivemos atitudes de retaliação ao povo ou ao governo paraguaio. Nós tomamos uma atitude política e isso se constata por um fato: a ampliação das relações econômicas, a ampliação das relações comerciais do Paraguai com o Mercosul nesse período.
Isso marca uma distinção entre a forma de tratar as divergências no seio do Mercosul vis-à-vis as formas que imperam em outras partes do mundo.
Acredito que o Mercosul não só mostrou grande maturidade, mas mostrou claramente que os povos não podem, de maneira alguma, sofrer as consequências de atos dos quais eles não participaram. Por isso, acredito que nós temos uma base real, em que o Paraguai possa, de fato, voltar ao Mercosul.
Querido presidente Mujica,
Durante o último semestre, o Uruguai contribuiu, de forma decisiva, para aperfeiçoarmos no Mercosul os mecanismos de participação dos setores sociais, dos movimentos sociais organizados de nossas sociedades. Essa participação social no esforço de integração regional é fundamental para o processo de afirmação democrática que estamos vivendo.
Nos últimos dez anos, o Mercosul conheceu avanços significativos nos pilares social e da cidadania, entre os quais o estabelecimento de um estatuto de cidadania e do plano estratégico de ação social, e a abertura de canais de diálogo com a sociedade civil, como a cúpula social. Como órgão de representação dos povos da região, o Parlamento do Mercosul também deve ser fortalecido. Espero que nossos legislativos nacionais nos permitam realizar, com a maior brevidade possível, eleições diretas para esse Parlamento regional. Nesse contexto, precisamos ainda com urgência estabelecer mecanismos viáveis de financiamento das políticas sociais regionais, ao amparo do plano estratégico de ação social.
Senhoras e senhores, aproveito essa oportunidade, mais uma vez, para reiterar, de forma pessoal, a minha, a do meu governo e a do povo brasileiro, reiterar a solidariedade ao presidente Evo Morales. Nós também fomos atingidos diretamente pelas recentes denúncias de que as comunicações eletrônicas e telefônicas de cidadãos e instituições de nossos países e de outros países da América Latina estão sendo objeto de espionagem por órgãos de inteligência. Isso fere nossa soberania e atinge os direitos individuais, inalienáveis, de nossa população. Defendemos que a soberania, a segurança de nossos países, a privacidade de nossas comunicações, a privacidade de nossos cidadãos, a privacidade de nossas empresas, devem ser preservadas, e esse é o momento de demonstrar um limite para o Mercosul. O governo e o povo brasileiro não transigem com sua soberania, como eu tenho certeza, os governos e os povos que integram o Mercosul não transigem com a deles.
Por isso, saúdo a decisão de rechaço tomada pelo Mercosul para todas as questões relativas, tanto ao ferimento da nossa soberania como o direito individual dos nossos povos. Mais do que manifestações, devemos também adotar medidas cabíveis, pertinentes, para coibir a repetição de situações como essa.
Queria também saudar a decisão de afirmação no âmbito do Mercosul do direito ao asilo. Finalmente, tenho certeza que nós devemos valorizar o Mercosul, porque diante, tanto dos momentos de expansão, quanto dos momentos de crise, o Mercosul é o melhor caminho para o fortalecimento de nossos países, para o desenvolvimento de nossas economias e para a afirmação da cidadania de nossos países.
Muito obrigada.
Assista ao discurso da presidente Dilma Rousseff no vídeo abaixo.