A Justiça começa a abrandar o toque de recolher para menores de 18 anos nas cidades de Ilha Solteira, Fernandópolis e Itapura, no interior de São Paulo. Os municípios foram os primeiros do País a adotar a restrição de horário como medida para reduzir a delinqüência juvenil.
Nessas cidades, crianças e adolescentes estão proibidos de ficar sozinhos à noite nas ruas e de frequentar eventos noturnos. Em Fernandópolis, a restrição de horário começa às 23h e em Ilha Solteira e Itapura, a partir da 20h30.
Mas agora, a proibição começa a ser derrubada pelos próprios juízes, que passaram a permitir a permanência de menores até de madrugada em algumas festas e shows noturnos e estudam a possibilidade de flexibilização do horário nas férias de julho.
Em duas grandes festas, realizadas em junho, os menores puderam ficar até de madrugada nas ruas. Em Fernandópolis, o show do grupo NX Zero levou milhares ao recinto onde se realizava a Exposição Agroindustrial. A festa durou 11 dias e os menores puderam frequentá-la e percorrer pelas ruas da cidade sem serem incomodados pelas blitze da polícia e dos conselheiros tutelares, que se tornaram comuns nos finais de semana desde que o toque de recolher foi adotado há quatro anos.
Em Ilha Solteira, um encontro de motociclistas também atraiu milhares de jovens durante três dias. No local do encontro foram montadas barracas para venda de comida, cervejas e refrigerantes. Algumas festas juninas, realizadas em escolas, também foram liberadas nas últimas semanas, mas a venda de álcool estava proibida.
Neste fim de semana, eles também poderão frequentar a tradicional festa Julina que acontece até domingo em Ilha Solteira. A festa é realizada nas ruas, que são enfeitadas e onde são montadas barracas para venda de comida típica e bebidas alcoólicas, como cerveja e vinho. "A permanência na festa está liberada, mas haverá conselheiros plantonistas e outros espalhados para evitar que os menores consumam bebidas alcoólicas", previne a presidente do conselho tutelar de Ilha, Célia Vieira Gabriel.
Pró-relaxamento
A justificativa dos juízes para o abrandamento é de que os adolescentes receberam bem, e até já se acostumaram ao toque de recolher. Além disso, segundo ele, os resultados colhidos até o momento embasam o relaxamento na rigidez da medida. Em Ilha Solteira, o Conselho Tutelar ainda não tem levantamento, mas segundo Célia, um redução foi constatada no volume de reclamações e de atos infracionais. Em Fernandópolis, as reclamações no Conselho Tutelar caíram 80%.
"Decidimos liberar os adolescentes porque eles entenderam nossa intenção com essa medida", disse o juiz Evandro Pelarin, da Infância e da Juventude de Fernandópolis, autor da introdução do toque de recolher na cidade. "Nossa intenção é ceder cada vez mais enquanto tivermos proteção dos adolescentes e os índices de criminalidade forem caindo", diz.
Segundo Pelarin, a experiência dos quatro anos de vigência do toque mostra que os menores 'incorporaram' a restrição de horário, "(com isso) passando a fazer parte do comportamento deles". "Por isso, festas religiosas e sem consumo de álcool estão liberadas", disse. "Nestes quatro anos observamos que eles (menores) mudaram o comportamento, assim como os programas destinados a eles também estão dando resultados excelentes e os índices de criminalidade baixaram incrivelmente", justificou Pelarin.
Lei seca
Além da flexibilização, o próximo passo de Pelarin é conseguir aprovação da Câmara dos Vereadores para que os bares que comercializam bebidas alcóolicas fechem depois das 23 horas, para reduzir a criminalidade e o consumo de álcool para menores que descumprem o toque de recolher.
Em Ilha Solteira, onde o toque foi introduzido em 20 de abril último, o juiz da Infância e da Juventude, Fernando Antônio de Lima, diz que a festa no encontro de motociclistas foi liberada para menores por meio de portaria específica. "Havia segurança para que os menores pudessem estar lá, por isso foram liberados", disse.
Segundo ele, o toque está sendo flexibilizado e será abrandado ainda mais com os passar do tempo. "O que nós queríamos, estamos conseguindo, que é fazer o jovem não dormir na sala de aula e não ficar em situação de risco nas ruas, especialmente de madrugada", disse.
De acordo com Lima, a intenção agora é esticar o horário de permanência dos menores nas ruas durante as férias escolares. Os horários - até as 20h para crianças até 13 anos; 22h para 14 e 15 anos; e 23h para 16 e 17 anos - deverão ser flexibilizados.
"Ainda estamos estudando como será a mudança", disse Lima. A periodicidade das blitze também foi reduzida. "Agora fazemos uma blitz a cada 15 dias ou a cada uma semana", diz a presidente do Conselho Tutelar, Célia Vieira Gabriel. No início, as blitze eram realizadas cinco vezes por semana.
"O mais importante é que, durante este período de toque de recolher, percebemos que aumentou em muito a presença dos pais com os filhos. Foi uma maneira que os filhos encontraram para ficar até mais tarde nas ruas e nas lanchonetes", explicou ela.